A viagem foi dolorosamente longa. A cada vagar pude imaginar-te esperando-me. A cada vagar pude temer que não o fizesses. Quando o comboio finalmente estagna, multidões precipitam-se para as suas bagagens. Evacuam à medida que abrem as portas de saída e inundam a estação de passos. Casacos compridos, guardas-chuvas a um estalido de se abrirem como janelas em dias de verão quente. Chove lá fora, quase torrencialmente. Permaneço sentada, escuto a chuva. Não sei se me esperas ou porque receio tanto saber. Alguém que me avisa que tenho de sair aqui e dou por mim a achar a viagem dolorosamente curta. Agora não tenho tempo para voltar atrás, o comboio estagnara de repente. A porta de saída está aberta e os meus passos mal se ouvem com o temporal que faz lá fora. Cá fora receio não te encontrar nas multidões que povoam a estação. Temo não te reconhecer. Estou atrapalhada, seguro a mala com as duas mãos. Presta atenção aos sinais - estou atrapalhada e por isso pego na mala com as duas mãos.
Vejo-te.
És inconfundivelmente tu. O teu ar nórdico, quase cru, a tua boca pouco modesta. Bonita, a tua boca. É inconfundivelmente a tua.
Avanço na tua direcção.
Perto de ti, aproximo o meu rosto do teu. A minha testa está perto da tua. O meu nariz, distraído, toca no teu. Os meus lábios, entreabertos, pairam próximos dos teus. Inconfundiveis, os teus lábios. Não há saudações, só a minha mão que segura a tua nuca, os meus olhos que se fecham. Quero sentir o teu cheiro, não digas nada. Presta atenção aos sinais - quero ficar aqui.
Largo a mala e o chão queixa-se num estrondo ignorado. Quero segurar-te com quantas mãos tiver o meu coração, sentir-te o peito, ter-te de olhos fechados. És tu. Estás comigo. Estou aqui. É verdade, é inconfundivelmente real.
Acordo.
Chove torrencialmente na minha janela, ou perto disso. O peito está acelerado, mãos que procuram um sossego ignorado, perdido. Não sei o que sonhei, mas sei que foi contigo. Foi inconfundivelmente contigo - foi o balbuciar do teu nome que me acordou, ainda me enchem o céu da boca as tuas iniciais, e os meus lábios sabem à tua língua. Mordo-os, levemente - Bom dia, meu querido.